“O universal é o local sem paredes.” (Miguel Torga) "Escrever é um ato de liberdade." (Antônio Callado) "Embora nem todo filho da puta seja censor,todo censor é filho da puta." (Julio Saraiva)

terça-feira, 31 de agosto de 2010

DOIS POEMAS DE LUPE COTRIM (1933-1970)

QUANDO ESTOU NATURAL

Quando estou natural
é que posso sentir-me
intimamente ligada
à vida.

Quando estou desprevenida,
- pés de água e de terra -
o corpo todo em contato
a caminhar erguido
e penetrado na atmosfera.

Compreendo, porque sinto
e depois penso:
- Não corrijo as sensações -
apenas as configuro
e lhes dou sentido.

Nenhuma vastidão me estreita
ou intimida;
com o natural em tudo,
numa entrega sem medida,
nos meus pés de água e terra
no meu ser de amanhã
- Eu existo a minha vida.


SONETO

"Transforma-se o amador na coisa amada"
- Camões -

Se anunciada foi vossa partida
e por clarins de lírios proclamada,
se sangrais nessa ausência minha vida
que o vosso ardor retém aprisionada;

se em vosso ser eu vejo-me represa
- livre corrente em posse perturbada -
se soubestes ao ver-me derrubada
erguer em mim a vossa fortaleza,

como quereis, senhor, que eu me liberte
só porque desejais assim partir
a uma nova paixão que vos desperte?

- Quiseste que eu tivesse a vossa crença
e me exigistes tanto ao possuir,
que eu sigo junto a ser vossa presença.

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Lupe Cotrim,
São Paulo, Brasil
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