“O universal é o local sem paredes.” (Miguel Torga) "Escrever é um ato de liberdade." (Antônio Callado) "Embora nem todo filho da puta seja censor,todo censor é filho da puta." (Julio Saraiva)

sexta-feira, 18 de maio de 2012

POR SOB O SOL...




por sob o sol
minha sombra caminha
ao teu encontro

por sob o mesmo sol
que envolve e aquece o teu corpo
a certeza de amanhã tornar-me ao pó
já não me incomoda tanto



18-05-12
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Júlio Saraiva
São Paulo, Brasil
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quinta-feira, 17 de maio de 2012

SONETO MALCRIADO



não - não me peçam mais poemas de amor
respeitem meus versos desesperados
tão mal sucedidos esculhambados
por deus me façam este grande favor

deixem-me mudo com os meus palavrões
pois é deste jeito que eu me sinto bem
a poesia que faço é puro desdem
as palavras doces enchem-me os culhões

basta-me apenas o ar que respiro
de uma vez por todas foda-se o resto
que importa saber se presto ou não presto?

não sei escrever... apenas atiro
no fim da briga saio são e salvo
dane-se aquele que errou o seu alvo


17-05-12

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Júlio Saraiva
São Paulo, Brasil
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terça-feira, 15 de maio de 2012

NA ESCURIDÃO




na escuridão o poema não dói tanto
a luz machuca o poema
provoca uma dor de faca afiada
e o sangue não estanca nunca

na escuridão as palavras parecem mais calmas
mesmo na dor são felizes
como aquele cego que tocava cavaquinho na praia
compunha marchinhas de carnaval
e mesmo sem poder ver a folia
enxergava melhor do que todos nós



15-05-12
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Júlio Saraiva
São Paulo,Brasil
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SUGESTÃO PARA MAIS TARDE



nem licor de amora
e nem amaretto
chá de capim santo
com cianureto

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Júlio Saraiva
São Paulo, Brasil
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BALADA DO TEMPO PERDIDO



- Para Cristiane


no tempo dos meus aniversários
- e aí já vai tanto tempo
eu brincava de ser alegre
disfarçava esta cara amarrada
dava um pontapé na gramática
e chorar não chorava

no tempo dos meus aniversários
minha mãe me trazia carinhos
meu pai me chamava de anjo
minha avó que era mãe da minha mãe
me amava em silêncio
como se eu fosse uma história
com um final bem feliz
e por isso não tinha final

no tempo dos meus aniversários
que eu já não me lembro quando
eu vivia tão distraído
tão longe das coisas do mundo
que um dia meu bem num segundo
me vi morto na contramão

no tempo dos meus aniversários
eu juro meu bem eu juro
eu não era assim tão cansado




14-05-12
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Júlio Saraiva
São Paulo, Brasil
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MANHÃ



queria escrever um poema de amor
nesta manhã nublada
qualquer poema de amor
mas perdi a chave de casa
e com ela o rumo das palavras
na falta do que fazer
dobro a esquina às seis e quinze da manhã
entro no bar
e peço uma bebida forte



14-05-12
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Júlio Saraiva,
São Paulo, Brasil
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sexta-feira, 11 de maio de 2012

DIA DAS MÃES

- para aquelas que embalam seus filhos mortos



suspiro de mulher cansada
na solidão nublada do quarto
um berço imaginário e vazio ao lado da cama
um choro feito de silêncio - e só
ardendo bem lá no fim-do-mundo da memória
lágrimas deixaram de ser lágrimas
mas o tempo impiedoso insiste
em traze-las de volta - sempre...
de que serve o poema nessas horas?



11-05-12

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Júlio Saraiva,
São Paulo, Brasil
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POEMA ECUMÊNICO



o pastor anuncia que o fim do mundo está perto
o padre de rito romano desmente
o bispo ortodoxo diz que até pode ser
o rabino prefere não falar nada
a mãe de santo - na dúvida - canta pra exu em nagô
o poeta acadêmico concorda um pouquinho com cada um
como não tem nada a perder quer que o fim-do-mundo se foda
manda a moral pro caralho
afrouxa a gravata
e escreve um soneto safado pra mulher do vizinho



11-05-12
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Júlio Saraiva
São Paulo,Brasil
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quinta-feira, 10 de maio de 2012

LAMENTO DO EU INDIGENTE



trago uma lua de plástico barato
escondida no branco do olhar
um breviário em latim na mão direita
na esquerda uma revista de mulher nua
dividido entre a oração & o desejo - sigo
o meu caminho sem nada esperar de mim

não preciso de óculos para ler os escuros
sei de cor todas as madrugadas por onde andei
sou grato pelas esmolas que me deram
só careço de alguém que me empreste algum remorso
para eu pagar as minhas multas

se eu morresse agora levava apenas
uma calça velha uma camiseta
um par de sandálias de lona & uma úlcera gástrica
os sonhos não - deixava todos por aqui mesmo
: bagagem demais me incomoda


10-05-12

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Júlio Saraiva,
São Paulo, Brasil
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quarta-feira, 9 de maio de 2012

POEMA SEM DESTINO



esta dor que dói
como o sótão vazio
de uma casa abandonada
este olhar sujo de ruínas
estas palavras doentes de significados
este meu país desconhecido
sem nome sem bandeira
sem coração
que não aparece em nenhum mapa



07-05-12
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Júlio Saraiva,
São Paulo, Brasil
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segunda-feira, 7 de maio de 2012

UM POEMA DE AMOR AO MEU AMOR

"Meu amor me ensinou a ser simples
Como um largo de igreja"
- Oswald de Andrade,no poema Ditirambo



o amor de cristiane é simples
sem cristais ouro ou prataria
sem modismos
sem medo de caminhar no escuro

quando cristiane se cala
seu silêncio toca na flauta
um chorinho do pixinguinha
e o que já era puro fica ainda mais puro
como as orações que as crianças
fazem na hora de dormir

refém deste amor
dou-me sempre por vencido
prometo não cochilar no cinema
deixo-me cair na armadilha boa da paixão
e invento palavras de sorvete com pedaços de abacaxi

o amor do meu amor é simples
como cantiga de roda
dessas que não se ouvem mais

o amor de cristiane é simples
como todo amor deve ser

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Júlio Saraiva,
São Paulo,Brasil
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sexta-feira, 4 de maio de 2012

PARA SEFÉRIS

"A voz do Senhor por sobre as águas.
Há uma ilha."
- Giorgos Seféris -


pela porta escancarada
da sala
faço entrar um poema
de seféris

o mar vem atrás dentro de um ícone
e sem cerimônia diz
não suportar mais a memória sagrada
dos navios

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Júlio Saraiva
São Paulo, Brasil,
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