“O universal é o local sem paredes.” (Miguel Torga) "Escrever é um ato de liberdade." (Antônio Callado) "Embora nem todo filho da puta seja censor,todo censor é filho da puta." (Julio Saraiva)

terça-feira, 18 de outubro de 2011

POEMA DA ESPERA

"Quando um apetite maligno impelia-me para os
     amores mortais, eu exaltava a vida.
Agora que considero, eu também , o amor como uma
     garantia da espécie, tenho em vista a morte."
- Ungaretti, em seu poema Lucca, com tradução de Sergio Vax -


aos vinte anos quando os sonhos são permitidos
- não importa o teor - todo mundo é poeta
até eu já fui
olhar de mulher - qualquer mulher me fascinava
chego aos 55 numa  contagem regressiva dos meus dias
dos meus anos vividos
aí já é princípio de loucura
aos 70 - talvez tenha sido drummond quem disse isso
e descaradamente surrupio seu verso é senilidade
tenho quinze ainda pela frente
vou com paciência arranjando as malas para a última viagem
só se é jovem mesmo aos vinte anos
releio a mim e aos poetas que aprendi a gostar
o resto é pura perda de tempo
é hora de começar irrigar a morte
com as minhas palavras
com o sangue que deixei nas madrugadas
com os luares que não enxergo mais
mas um dia afinal achei que os poemas eram todos
feitos de luares imensos e gemidos loucos nos leitos de amor
acontece que eu tinha só 20 anos
e os trens que eu me punha a esperar nas gares
partiram todos
para onde não sei - mas me lembro da passageira imaginária
que me disse até breve com um adeus bonito
nas mãos muito brancas
nos meus barcos de papel também não acredito mais
devem ter naufragado todos
e triste percebo que o único sobrevivente sou eu
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Júlio Saraiva,
São Paulo, Brasil
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