“O universal é o local sem paredes.” (Miguel Torga) "Escrever é um ato de liberdade." (Antônio Callado) "Embora nem todo filho da puta seja censor,todo censor é filho da puta." (Julio Saraiva)

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

CANÇÃO DO PARQUE BUENOS AIRES

bebês ricos
babás pobres

o velho judeu
na cadeira de rodas
dorme debaixo da sombra
de uma seringueira
seu sono é ensaio pra morte

babás pobres
bebês ricos

o velho judeu
quando acorda diz
ao enfermeiro
com a fala enrolada
que o brasil é a terra prometida
onde jorra leite e mel

bebês ricos
babás pobres

o enfermeiro está farto
de ouvir do velho judeu
histórias do tempo
em que ele vendia
casimira inglesa de porta
em porta

babás pobres
bebês ricos

o velho judeu
fez dinheiro e filhos fez
também
um dia veio o segundo derrame
e o condenou à cadeira
de rodas
(não vai mais à sinagoga)

babás pobres
bebês ricos

os filhos do velho judeu
deram-lhe netos
- três
o mais velho foi pra europa
notícias nunca mandou
o do meio vive no rio
onde tem uma banda de rock
a menina
estudada em londres
hoje só dá desgosto
se apaixonou por um motoboy
que mora na vila alpina

bebês ricos
babás pobres

o velho judeu
se assusta a cada menino
de olhos verdes
que passa correndo
num sobe-e-desce pelas
ladeiras do parque
mama ídiche desconsolada
em sua eterna agonia
queixa-se à cadela de raça
que a oitava praga do egito
desabafou sobre a família

babás pobres
bebês ricos

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Júlio Saraiva,
São Paulo, Brasil
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