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sábado, 9 de janeiro de 2010

Ferreira Gullar: sinônimo Brasil


O que dizer deste homem magro, pequeno e franzino? Fumante inveterado, um dia aportou no Rio de Janeiro, vindo de São Luís do Maranhão, filho de um quitandeiro, com um livro de poesia debaixo do braço- A Luta Corporal,colocado, por equívoco do livreiro, por causa do título, na prateleira dos livros de esportes, o que nunca foi o forte de Gullar. Mas precisou que o próprio poeta, numa de suas andanças por livrarias reparasse isto. José de Ribamar Ferreira, adotou por pseudônimo literário Ferreira Gullar. Todo maranhense é José de Ribamar, por conta de um santo- até ele. Poeta, crítico de arte, ensaísta, artista plástico e jornalista profissional é dono de uma inteligência fora do comum. É dele o maior poema épico depois de Os Lusíadas, de Camões, escrito em língua portuguesa - O Poema Sujo. Sobre ele não há mais nada a dizer.

Júlio Saraiva,
UM POEMA DE FERREIRA GULLAR
                       
O teu mais velho canto,
arrastado com o sol varrido
no coração das épocas
eu o recolho,agora, entre estas pedras queimando
                                                                                 Tua boca real
clareia os campos que perdemos.
Eu jazo detrás da casa, aonde ninguém vai
(onde a mitologia sopra, perdida dos homens,
entre flores pobres)

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Verão



Este fevereiro azul
como a chama da paixão
nascido com a morte certa
com prevista duração

deflagra suas manhãs
sobre as montanhas e o mar
com o desatino de tudo
que está para se acabar.

A carne de fevereiro
tem o sabor suicida
de coisa que está vivendo
vivendo mas já perdida.

Mas como tudo que vive
não desiste de viver,
fevereiro não desiste:
vai morrer, não quer morrer.

E a luta de resistência
se trava em todo lugar:
por cima dos edifícios
por sobre as águas do mar.

O vento que empurra a tarde
arrasta a fera ferida,
rasga-lhe o corpo de nuvens,
dessangra-a sobre a Avenida

Vieira Souto e o Arpoador
numa ampla hemorragia.
Suja de sangue as montanhas,
tinge as águas da baía.

E nesse esquartejamento
a que outros chamam verão,
fevereiro ainda em agonia
resiste mordendo o chão.

Sim, fevereiro resiste
como uma fera ferida.
E essa esperança doida
que é o próprio nome da vida.

Vai morrer, não quer morrer.
Se apega a tudo que existe:
na areia, no mar, na relva,
no meu coração - resiste.

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Ferreira Gullar,
Rio de Janeiro, Brasil
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2 comentários:

  1. machismo à parte, ao lado de adélia prado, a dona doida ou o drummond em saias, ferreira gullar é o maior poeta brasileiro em atividade.
    j.

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  2. calças e saias à parte, Gullar é o maior poeta brasileiro em atividade.

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