BBC Brasil
em porto príncipe agora
nenhum menino negro e miserável pergunta as horas
porque o tempo deixou de correr em porto príncipe agora
nenhuma mulher negra e miserável apertará o seio murcho à
procura da última gota de leite para dar ao filho faminto
em porto príncipe agora nenhum poeta escreverá uma
canção de amor e nem de protesto
em porto príncipe agora há um desenho de escombros
porque porto príncipe resume-se a escombros
porque em porto príncipe agora a hora já não existe
a vida já não existe
em porto príncipe agora quando nem o céu mais respira
e nem deus faz o menor sentido
nenhum poema será solução para porto príncipe agora
porque porto príncipe agora é porto príncipe ontem
só um cheiro de morte
em porto príncipe agora se espalha no ar
em porto príncipe agora
o presidente dos estados unidos vomita dólares
e faz um discurso quase comovente
e eu faço que acredito na hipocrisia
para porto príncipe agora
quando o povo do haiti está morto ou mais fodido do que
nunca
agora
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Júlio Saraiva,
São Paulo, Brasil
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parece que nem tem sentido dizer. dá vontade de gritar.
ResponderExcluirO facto de esta violência da natureza ser tão aleatória, nos devia provar que todas as perguntas e respostas estão apenas em nós. Nenhum poema será solução, de facto, mas viva o poema, de qualquer forma, pois mesmo sem ser solução, de tanta porcaria que leio e vejo, é o único que não envergonha. Só o assumir pela humanidade de toda uma responsabilidade para connosco e para com o outro, que está, estará sempre, ligado a nós, o outro que sou eu, será solução.
ResponderExcluirJúlio, posso divulgar este seu poema?
ResponderExcluirlaura, minha flor, este poema é do mundo. faz dele o que quiser. se me rendesse dinheiro, iria para as vítimas.publique onde e como quiser.
ResponderExcluirafeto.
j.
Qual é o cheiro da morte?
ResponderExcluirQual o sabor? Não perguntem
aos mortos. Eles não contam.
Os mortos penetraram no mistério.
Resta a nós, mortais, a dor.
Inútil, como tudo, resta-nos a dor.
Toda palavra é inútil
e, de certa forma, estúpida.
Um abraço inútil
mas amigo.