“O universal é o local sem paredes.” (Miguel Torga) "Escrever é um ato de liberdade." (Antônio Callado) "Embora nem todo filho da puta seja censor,todo censor é filho da puta." (Julio Saraiva)

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

A POESIA MARGINAL BRASILEIRA

Perguntam-me, os mais novos me pedem, que defina o que se convencionou chamar de poesia marginal brasileira.Não sei se vou ter a elegância de Glauco Mattoso, um estudioso da matéria.  E um grande poeta, acima de tudo.
Tenho, sim, obrigação moral que as novas gerações entendam, porque já estamos na casa dos sessenta anos - e no bico do corvo -. com uma literatura quase encerrada pelo que a vida é, faz e não perdoa.
 Poesia marginal não foi um movimento literário - nem sabíamos o que era isto. Fazíamos só poesia. Mas o marginal, entendam no sentido sociológico, o que vive à margem. Era assim.  Alguns quase todos ou todas eram ligados a partidos de esquerda. Mas tínhamos todos uma influência grande dos modernistas, Oswald de Andrade( com seu cínico  e genial"Amor/Humor.), mas que nunca me fascinou - embora todos ou todas o adorassem.. Houve, sim, grande influência dos tropicalistas - Caetano, Gil e TomZé, fora os poetas (brilhantes) Capinam e Torquato. O tropicalismo foi um movimento. Organizado ou não, mas foi. E que se inclua nisso, no movimento, digo, os maestros e regentes Rogério Duprat, Júlio Medaglia e Damiano Cozella, pelos seus arranjos irreverentes para a época, nos quais misturavam o clássico, que era da formação deles - todos saídos das melhores sinfônicas -, com o chamado popular.
 Eu, entre poetas, já preferia Dante Milano, poeta de um livro só, e Bandeira, afora Drummond e Vinícius.. Mas isso é uma outra história. E o que preferi ou deixei não vem ao caso. Nem importa.
É Glauco Mattoso em seu livro, O Que é Poesia Marginal, quem define  o que éramos: uma geração de loucos e loucas, quase todos bêbados e drogados, não havia outra saída. Não tínhamos como publicar nossos trabalhos. Na maioria das vezes eram feitos mesmo a mão ou mimeógrafados. Vendíamos a preço de pinga, para que nos pagassem o sanduíche, isto quando não acabávamos presos, o que era comum.Nossa poesia era comercializada em portas de universidades, teatros ou botequins - quando a polícia deixava. O dinheiro mal dava pro ônibus. Voltei pra casa muitas vezes a pé. E minha mãe dizia que eu não tinha jeito.
Desta geração destaco a maior voz da poesia brasileira - Ana Cristina Cesar, uma menina linda que se matou aos 31 anos. Seguem a ela, porque  Ana foi imbatível, Paulo Leminski, com sua genialidade de conhecer línguas estranhas - como o sânscrito, por exemplo -, Cacaso(Antônio Carlos de Brito), Isabel Câmara (a Bel) e Torquato Neto - este último eu não pude conhecer, suicidou-se com gás aos 28 anos.
Acho que já disse muito.

j.

_____________________________
Júlio Saraiva,
São Paulo, Brasil
_______________________________

Um comentário:

  1. Muito bom saber Julio, que você também fez parte desse movimento cultural tão importante por sua originalidade e expressividade durante a ditadura militar,nesse propagar de boca a boca, mão a mão, fazendo chegar ao povo, poesia de boa qualidade.

    beijocarinho, Lu

    ResponderExcluir

Compartilhe o Currupião