“O universal é o local sem paredes.” (Miguel Torga) "Escrever é um ato de liberdade." (Antônio Callado) "Embora nem todo filho da puta seja censor,todo censor é filho da puta." (Julio Saraiva)

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

VARIAÇÕES SOBRE O MESMO SONETO

I

esta pálida luz do teu silêncio
habita os corredores da memória
vai cortando o tempo ao meio e vence o
velho era-uma-vez de toda história

e tudo o que já fomos agora dói
feridas que não cicatrizam nunca
a maldição a caminhar adunca
esta traça que aos bocados nos corrói

assim nos morrem todos os assuntos
tal como nós também morremos juntos
a ambição do nada é o que nos resta

nada nada nada mil vezes nada
comemos das sobras do que foi festa
até que cesse enfim a caminhada

II

as árvores devoraram as datas
sobraram apenas dos tempos idos
velhos vestidos mofadas gravatas
além dos livros que não foram lidos

também fazemos parte das sucatas
como possessos fora dos sentidos
não damos conta das mais insensatas
frases que ferem os nossos ouvidos

não nos dói mais a velha chaga exposta...
no meio da sala já quase sem luz
a tua sombra na minha se encosta

eis enfim a pena a que fizemos jus
por terra cai a derradeira aposta
tudo em nós é morte tudo em nós é cruz

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Júlio Saraiva,
São Paulo, Brasil
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